Opinião
Buffet que patrocinei ao amante da minha esposa!
Uma das coisas que poderão ilibar-me de todos os pecados que cometi na vida e subir ao paraíso é o facto de ter patrocinado, sem saber, rezas da morte do amante da minha esposa (que Deus o tenha!).
Ninguém merece, e não desejaria que alguém passasse pelo que passei.
Foi exactamente há cinco anos que, numa tarde de quinta-feira, recebi uma chamada telefónica de alguém próximo da minha esposa - estamos casados oficialmente há 11 anos. Essa chamada deixou-me preocupado, uma vez ser uma amiga que pouco conversava comigo.
Quando ouvi o celular a tocar, fiquei assustado, uma vez ser estranha aquela ligação. Era mesmo amiga da minha esposa.
– Alô, boa tarde? – Saúda ela. Respondi, longe de intimidades.
– Cunhado, estás no serviço? Antes de responder, ela prometeu chegar ao meu gabinete. Dito e efeito, não levou mais de 10 minutos, lá estava no meu “office”.
Da cara habituada de confidente da minha esposa, a que estou habituado a ver, havia uma distância da que estava diante de mim. Mas não me fiz de rogado e perguntei o que estava a passar-se. Ela simplesmente respondeu que a irmã dela, neste caso a minha esposa, não estava bem de saúde e já tinha sido levada para casa dos pais, aqui na cidade.
Apreensivo, fiz questão de proceder como mandam as regras básicas: tratar de me desligar dos meus trabalhos e seguir estrada em direcção à sograria para ver o que estava realmente a acontecer.
Quando lá cheguei, receberam-me com todas as honras. Quando pergunto onde estava a minha esposa, responderam-me que se encontrava numa das salas da casa com as amigas e membros da congregação da minha sogra. Até aí não havia problemas. Quando lá entrei, vi-a com capulanas em quase todas as partes do corpo, no centro, em orações típicas de uma mulher que acabava de perder o marido. De nada sabia e muito menos desconfiava do que tinha sucedido.
Tento perceber o que estava efectivamente a acontecer e me informaram que desde as 12h que estava aos choros, mas com as orações as lágrimas iam diminuindo. Quando ligo para o meu amigo, um médico cubano, depois de saber que a minha mulher só estava a chorar, ele tranquilizou-me dizendo que aquilo fazia parte das doenças psicossomáticas, que provocam problemas emocionais ou sentimentais como raiva, ansiedade, angústia, medo ou desejo de vingança. Avançou ainda que o ambiente familiar pode ajudar muito para superar o problema.
A minha mulher é daquelas famílias muito religiosas. Foi também dentro do ambiente religioso que a conheci. Preferi que o ambiente permanecesse religioso até à sua recuperação. Até porque mesmo o médico assim o recomendou.
Olhando para o número de pessoas, que não paravam de ir à casa dos meus sogros, tive de garantir a logística. Com efeito, saí com as minhas cunhadas para o supermercado para comprar alguns produtos alimentares. Para não ser um ambiente mesmo de consternação, fui mais criativo e aluguei uma tenda com o serviço de buffet incluído. Ainda tive de encomendar bons arranjos de flores. O que eu sabia? Nada.
Ela regressou uma semana depois, acompanhada de respeitados padrinhos, irmãos de sangue e da igreja. Pouco ou nada me restava senão conformar-me com a triste e incomum doença emocional da minha esposa. Se eu soubesse? Mas nada. Tudo estava fechado a sete chaves. Mas a boa-nova ainda estava para vir.
Como não há segredos nem males que durem para sempre, cinco anos depois, uma amiga veio até mim desabafar. Levou quase um mês a ensaiar, sobretudo a convencer-me que tínhamos de assinar um acordo de “não-revelação do segredo” que há cinco anos também era segredo entre algumas amigas da minha esposa e parte da família. E não acredito que a minha sogra conheça a razão daquela cerimónia chamada de “doença emocional”.
Foi preciso um retiro e tive de mentir à minha esposa dizendo que ia participar num seminário em “Chidenguele”. Do lado da amiga da minha esposa não sei qual foi a verdade que construiu para o seu marido para que, efectivamente, concordasse com a suposta deslocação da companheira a “Nampula”. Foi um retiro bastante produtivo entre nós, de segunda a sexta-feira à tarde. Não vou contar os detalhes, se no segundo dia ainda continuamos em camas separadas e se assim foi para o resto dos dias até hoje. Esta é outra história que não vele a pena contar. Vamos aos dias de choros da minha esposa.
Naquela tarde de quinta-feira de há cinco anos, vi imagens partilhadas nas redes sociais de um jovem moçambicano que teve um acidente aparatoso e fatal em Malelane, território sul-africano. Eu e tantos outros saímos em solidariedade ao post que tinha sido publicado com um simples R.I.P.
Na verdade, a solidariedade estendia-se até à minha companheira de cama. Ela acabava de perder o seu verdadeiro amor, o amante, razão que a levou a ter uma “doença emocional”, a mesma pela qual por uma semana tive de fazer um investimento em casa da minha sogra, longe de imaginar o que hoje sei.
O que farias no meu lugar? Eu ainda não tomei nenhuma decisão porque a amiga continua a cuidar da minha saúde espiritual e não me dá vontade, até agora, de fazer qualquer tipo de investida.
Será que preciso de esperar pelo dia em que nos vamos zangar ou ela tentar zangar-se comigo? Ou temos de viver assim?
A decisão de nada dizer à minha esposa resulta do pacto que tive com a amiga dela. Entretanto, decidi partilhar convosco esta história, e apenas falta graduar a minha companheira, mãe dos meus filhos, pela criatividade de homenagear o seu amante.
Enfim, enquanto a nossa amiga cuidar de mim e da minha esposa, guardarei esta verdade de “doença emocional”.
Até breve!